quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Bebê criado para curar irmão

Publicada em 14/10/2008 às 23:19

Nasce na Espanha bebê selecionado geneticamente para curar o irmão

Extra, EFE e Reuters
Soledad Puertas e seu bebê, Javier - foto: Reuters
Com o nascimento do pequeno Javier, no domingo, o menino espanhol Andrés, de 6 anos, ganhou mais do que um irmão. O pequeno recebeu um verdadeiro presente: a cura para uma grave anemia congênita.
Javier é o primeiro caso em que todo o procedimento para gerar um bebê selecionado geneticamente para salvar seu irmão foi realizado na Espanha. O bebê, que nasceu no Hospital Virgen del Rocío de Sevilla, com 3,4 quilos, traz a esperança de dar a cura a seu irmão Andrés. O menino sofre de beta talassemia - caracterizada pela impossibilidade de fabricar hemoglobina, o que obriga a realização de transfusões sangüíneas intermináveis - e precisa de um transplante de medula. O sangue do cordão umbilical de Javier será transplantado em Andrés para que ele comece a fabricar células sangüíneas saudáveis ( o que você acha de se mudar geneticamente um embrião para salvar a vida de outra pessoa? ).
Pais investigaram
Os pais das crianças, Soledad Puertas e Andrés Mariscal, não sabiam muito sobre células-tronco. Diante da enfermidade de Andrés, eles começaram a investigar os possíveis tratamentos e, quando obtiveram a permissão da Comissão Nacional de Reprodução Assistida para realizar o diagnóstico genético pré-implantacional, decidiram que o procedimento era a melhor maneira de conseguir uma cura para Andrés. O diagnóstico é uma técnica que permite comprovar se um embrião está são ou não, do ponto de vista genético, antes de ser transferido ao útero materno. A nova opção terapêutica passou a ser permitida em 2006 com a aprovação da Lei de Reprodução Humana na Espanha.
" Graças a ele, Andrés poderá ficar curado e voltará a ser um menino normal "

A mãe, Soledad, disse que o menino de 6 anos está consciente de que o novo membro da família pode salvar sua vida.
- Javier nasceu saudável e graças a ele nosso filho Andrés, que está desejando conhecer o irmão porque sabe que ele lhe ajudará, poderá ficar curado e voltará a ser um menino normal - afirmou Soledad Puertas em entrevista ao site Público.
Até o momento do transplante, o sangue ficará armazenado no Banco de Cordão Umbilical de Málaga.
- Este tipo de transplante, que poderá ser realizado nas próximas semanas, tem uma taxa de cura que chega a 90%. Além disso, o cordão obtido é de muito boa qualidade - explicou o director da Unidade de Genética, Reprodução e Medicina Fetal do Hospital Sevillano, Guillermo Antiñolo, ao site El Mundo.
Médicos consultados pelo Extra disseram não ter conhecimento de casos semelhantes no Brasil.
Como o tratamento foi feito na Espanha
Para realizar o diagnóstico genético pré-implantacional (PGD, na sigla em inglês), os embriões são fecundados (seguindo o mesmo método de um procedimento in vitro). Depois, examina-se o seu material genético para comprovar se os embriões não são portadores de alguma enfermidade.
O método permite a concepção e o parto de um bebê que não só está livre da enfermidade hereditária que sofre seu irmão, como também proporciona um doador idôneo, capaz de possibilitar sua cura mediante um transplante a partir do sangue do cordão, que tem um perfil compatível. Esta compatibilidade faz com que as possibilidades de Andrés não rejeitar o transplantes das células-tronco do cordão umbilical de Javier fiquem entre 70% e 90%.
- Muitas vezes não dá para usar o sangue de cordão umbilical de um banco por falta de compatibilidade. Nestes casos, o mais prático é um irmão, que será um doador compatível com certeza - explica Dirceu Mendes Pereira, Diretor-médico da clínica Roger Abdelmassih, em São Paulo, e presidente da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana.
Geralmente, de cada 16 embriões que um casal obtêm por fecundação in vitro, somente três estão livres da enfermidade e são compatíveis com o irmão doente. Os pais de Andrés e Javier, se submeteram a dois ciclos reprodutivos, um em dezembro e outro em fevereiro.
Quimioterapia
Para que o procedimento tenha êxito, é necessário submeter o paciente a um tratamento com quimioterapia. O processo do transplante deve ser completado em 20 dias.
- A intensidade não é a mesma que se necessita para tratar um câncer, porque não é preciso eliminar tumor. A quimioterapia é empregada para reduzir os riscos de rejeição e permitir que a medula se enxerte - esclarece o médico Miguel Ángel Canales, membro do Serviço de Hematologia do Hospital Madrileño de La Paz, em entrevista ao site El Mundo.
Ética do tratamento é discutível
Segundo o presidente da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana, Dirceu Mendes Pereira, no Brasil não há lei para a reprodução assistida. Para realizar procedimento semelhante ao do casal espanhol, seria necessária a aprovação do caso pelo Conselho Federal de Medicina.
- Não me parece que salvar uma vida pode ferir a ética do Conselho - analisa o médico, que explica que o diagnóstico PGD já é feito no Brasil para eliminar embriões de casais com alguma enfermidade na família.
Já na opinião de Jorge Hallak, especialista em reprodução humana, a seleção de embriões gera um sério problema ético:
- O que fazer com os embriões não selecionados? No Brasil, o descarte é proibido. Não acho o tratamento condenável, mas não deve ser encorajado. Não acredito que essa seleção tenha amparo legal. A lei é vaga.
Carolina Dieckmann no papel de Camila - Foto: arquivo Novela já retratou caso
O Diagnóstico Genético Pré-Implantacional (PGD) foi usado pela primeira vez em 2000, nos EUA, para salvar uma menina de 6 anos. A primeira filha do casal Lisa e Jack Nash, Molly, nasceu com anemia Fanconi. A deficiência é fatal se não houver um transplante como o que recebeu de seu irmão, Adam, que nasceu em 29 de agosto de 2000, em Denver, com a ajuda da técnica PGD.
Uma situação semelhante foi retratada na novela "Laços de família", exibida pela Globo em há oito anos. Para tentar salvar sua filha Camila (interpretada pela atriz Carolina Dieckmann) da leucemia, Helena (vivida por Vera Fischer) procura o pai da jovem, Pedro (José Mayer), e faz sexo com ele na esperança de engravidar de um filho que seja compatível com Camila.
Segundo o autor da novela, Manoel Carlos, a trama foi inspirada num caso real de uma mulher americana que tinha uma filha que estava com leucemia e, para conseguir a compatibilidade necessária ao transplante, ela engravidou e conseguiu salvar a vida a menina.
O supervisor do Banco de Cordão do Instituto Nacional do Câncer, Flávio Paraguassu Braga, lembra que o procedimento é a última medida:
- Selecionar um embrião é um caso extremo, quando não há encontra doador compatível na família ou nos registros nacionais e internacionais. Em geral, doações da família ou de bancos garantem 80% dos transplantes de medula óssea no Brasil.

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